01 junho 2006

França


Marguerite Duras (1914-1996)

http://www.alovelyworld.com/webfranc/index2.html

Ontem à noite

Marguerite Duras

Tradução de Tereza Coelho

Ontem à noite, depois da sua partida definitiva, fui para aquela sala do rés-do-chão que dá para o parque, fui para ali onde fico sempre no mês de junho, esse mês que inaugura o Inverno. Tinha varrido a casa, tinha limpo tudo como se fosse antes do meu funeral. Estava tudo depurado de vida, isento, vazio de sinais, e depois disse para comigo: vou começar a escrever para me curar da mentira de um amor que acaba. Tinha lavado as minhas coisas, quatro coisas, estava tudo limpo, o meu corpo, o meu cabelo, a minha roupa, e também aquilo que encerrava o todo, o corpo e a roupa, estes quartos, esta casa, este parque. E depois comecei a escrever...

Textos Secretos, Quetzal Editores, 1992 - Lisboa, Portugal

http://zezepina.utopia.com.br/poesia/

EUA

Elizabeth Bishop (1911-1979)

Uma arte

Elizabeth Bishop
Tradução de Horácio Costa

A arte de perder não tarda aprender;
tantas coisas parecem feitas com o molde
da perda que o perdê-las não traz desastre.

Perca algo a cada dia. Aceita o susto
de perder chaves, e a hora passada embalde.
A arte de perder não tarda aprender.

Pratica perder mais rápido mil coisas mais:
lugares, nomes, onde pensaste de férias
ir. Nenhuma perda trará desastre.

Perdi o relógio de minha mãe.
A última,ou a penúltima, de minhas casas queridas
foi-se. Não tarda aprender, a arte de perder.

Perdi duas cidades, eram deliciosas.
E,pior, alguns reinos que tive, dois rios, um
continente. Sinto sua falta, nenhum desastre.

- Mesmo perder-te a ti (a voz que ria, um ente
amado), mentir não posso. É evidente:
a arte de perder muito não tarda aprender,
embora a perda - escreva tudo! - lembre desastre.

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Ucrânia



Patrycia Kylyna, 1936

Árvore

Ela é peneira para a minha farinha de sol.
Ela é rede
pela qual foge o plâncton dos pássaros.
Ela é esponja, que na rasura do vale
se nutre de sombras.

Tradução do Ucraniano Wira Selanski

O grupo de Nova York. Colméia. Antologia lírica. Companhia brasileira de artes gráficas. Rio de Janeiro. 1993

Propaganda

Meus antepassados já estão mortos,
acabo de ouvir a notícia no rádio,
e espanto-me de existir.
Mas agora me lembro
que meus descendentes foram mortos há muito tempo,
que a notícia sobre eles já se tornou conto de fadas,
e não me espanto mais.

Tradução do Ucraniano Wira Selanski

O grupo de Nova York. Colméia. Antologia lírica. Companhia brasileira de artes gráficas. Rio de Janeiro. 1993

Na chaleira está o outono

Na chaleira está o outono.
As folhas castanhas de molho, qual chuva,
a água castahna esfria, qual geada,
torna-se amarga, como no brejo,
onde os arbustos amarelos colhem seus frutos.
Em cada xícara há uma poça, igual a um pequeno lago,
de onde fugiram os patos de olhos pardos.
Até em cada colherzinha
os sonhos das rãs trazem sombras.
Na chaleira está a velhice e Samarcanda.

Tradução do Ucraniano Wira Selanski

O grupo de Nova York. Colméia. Antologia lírica. Companhia brasileira de artes gráficas. Rio de Janeiro. 1993

http://poetry.uazone.net/portuguese.html

Tabela de tradução de ucrâniano
http://membres.lycos.fr/mazepa99/1page.htm