27 maio 2006

Chile

A casa "Sebastiana" de Pablo Neruda.

Pablo Neruda comprou a casa em construção, e depois convenceu alguns amigos artistas a comprar as partes laterais, reservando quatro níveis do centro para si. Cada artista construiu a sua casa ao seu gosto. A casa foi inaugurada em 1961. http://www.alovelyworld.com/webchili/htmgb/chl105.htm


Pablo Neruda

Thiago y Santiago

Thiago, A Santiago, como un vago mago,
has encantado en canto y poesía.
Sin San, has hecho de Santiago, Thiago,
un volantin de tu pajarería.

Al Este y al Oeste de Santiago
diste el Norte y el sur de tu alegría.
Muchos dones nos diste, un solo estrago:
llevaste el corazón de Anamaría.

Te perdonamos porque com tu bella,
de rosa en rosa y de estrella en estrella,
te llamará el Brasil a su desfile.

Te irás, hermano, com la que elegistes.
Tendrás razón, pero estaremos tristes,
que hará Santiago sin Thiago de Chile.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/pneruda01p.html

26 maio 2006

Canadá

Montreal
http://pt.trekearth.com/gallery/North_America/Canada/photo389416.htm

Maria do Carmo Vieira-Montfils

POESIA ÚTIL

A minha poesia é inútil.
Mas continuo a escrever
talvez por algum motivo fútil...
Vaidade, prazer,
penitência, dor,
amor...
Versos existenciais,
outros circunstanciais,
não menos experienciais,
povoam meu pensamento.
Queria dar-lhes uma função
para o bem da humanidade,
para o seu desenvolvimento.
E que coubessem numa canção
com toda a serenidade.
Quem sabe se eu defendesse uma causa,
se eu falasse contra o racismo,
se eu lutasse contra o egoísmo
e o individualismo...
o mundo faria uma pausa?
A minha poesia é inútil.
Mas continuo a escrever
talvez por algum motivo fútil.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/mmontfils.html#util

"SEM MOTIVO "
Queria um poema leve,
suave,
um poema como a neve,
branco.
Que, mesmo sendo manco,
fluísse solto, isento,
como o vento.
Um poema sem quotidiano,
sem nação,
como ouvir piano.
Um poema sem razão.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/mmontfils.html#util

Pedro Tavares, N.º 24 - 7.º 2.ª
02 Junho, 2006 14:22


Hoje, finalmente, quero despedir-me de ti.
Não que não te queira mais ao meu lado,
para escutar-me, nas minhas aventuras, nas minhas descobertas,
nos meus lamentos e alegrias.
Em nome de um valor mais alto que o meu egoísmo,
deixo-te partir para os campos da felicidade,
com que sempre sonhaste.
Por tempo demais te retive.
Em sonhos, vi tua imagem,
senti teu abraço. Em livros que li,
em cartas que escrevi,
vi teu pensamento.
Encontrei-te no brilho das estrelas.
Sei que tudo tentaste para me consolar.
Mas precisei desse tempo
para aceitar tua partida.
E mesmo isto compreendeste.
Precisei sofrer muito,
mas afinal entendi que tens o teu caminho
que é só teu.
E que deve ser percorrido com alegria.
Perdoo-me de minhas culpas,
pois sei que me perdoas.
Seja a tua felicidade
a minha paz.
Hoje, finalmente, quero despedir-me de mim.
Não que não queira mais ser como eu era,
quando estavas aqui.
Em nome de um valor mais alto que a morte,
retomo a vida.
Maria do Carmo Vieira-Montfils

http://www.jornaldepoesia.jor.br/mmontfils.html#luto

Pedro Tavares, N.º 24 - 7.º 2.ª
02 Junho, 2006 14:53

Macau

http://pt.trekearth.com/gallery/Asia/China/photo238023.htm

Manuel Martins Gaspar Tomé

Essência da Saudade


Passaste por mim
de madrugada
etérea, levemente e foste sombra
Assim te perdi
quando entraste
na luz da manhã
Sinal visível da tua passagem
a rosa vermelha
deixada no chão
do meu peito

http://www.jornaldepoesia.jor.br/mmartins.html

S. Tomé e Príncipe

Maria Manuela Margarido

Memória da Ilha do Príncipe

Mãe, tu pegavas charroco
nas águas das ribeiras
a caminho da praia.
Teus cabelos eram lembas-lembas,
agora distantes e saudosas,
mas teu rosto escuro
desce sobre mim.
Teu rosto, liliácea
irrompendo entre o cacau,
perfumando com a sua sombra
o instante em que te descubro
no fundo das bocas graves.
Tua mão cor-de-laranja
oscila no céu de zinco
e fixa a saudade
com uns grandes olhos taciturnos.

(No sonho do Pico as mangas percorrem a órbita lenta
das orações dos ocãs e todas as feiticeiras desertam
a caminho do mal, entre a doçura das palmas).
Na varanda de marapião
os veios da madeira guardam
a marca dos teus pés leves
e lentos e suaves e próximos.
E ambas nos lançamos
nas grandes flores de ébano
que crescem na água cálida
das vozes clarividentes.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/mmm01.html

18 maio 2006

Grécia

Naxos

Konstantiínos Kaváfis (Alexandria, 29/4/1863-29/4/1933)

O nome do poeta no alfabeto grego: Κωνσταντίνος Πέτρου Καβάφης,


MAR DA MANHÃ

Hei de deter-me aqui. Também eu contemplarei um pouco a natureza.
Do mar da manhã e do céu inube
azuis brilhantes, e margem amarela; tudo
belo e grandiosamente iluminado.

Hei de deter-me aqui. E me enganar que os vejo
(em verdade os vi por um momento ao deter-me)
e não também aqui minhas fantasias,
minhas recordações, as imagens do prazer.

[51, 1915]

ΘΑΛΑΣΣΑ ΤΟΥ ΠΡΩΙΟΥ

Εδώ ας σταθώ. Κι ας δω κ’ εγώ την φύσι λίγο.
Θάλασσας του πρωιού κι ανέφελου ουρανού
λαμπρά μαβιά, και κίτρινη όχθη· όλα
ωραία και μεγάλα φωτισμένα.

Εδώ ας σταθώ. Κι ας γελασθώ πως βλέπω αυτά
(τα είδ’ αλήθεια μια στιγμή σαν πρωτοστάθηκα)·
κι όχι κ’ εδώ τες φαντασίες μου,
τες αναμνήσεις μου, τα ινδάλματα της ηδονής.

[51, 1915]
Organização: R. M. Sulis, Tradução: R. M. Sulis, M. P. V. Jolkesky, A. T. Nicolacópulos

http://cavafis.i8.com/a051.htm

Lucian Blaga, Roménia

Primavera em Moeciu

http://pt.trekearth.com/gallery/Europe/Romania/page27.htm

Lucien Blaga

DORUL

Seţos iţi beau mirasma şi-ţi cuprind obrajii
cu palmele-amândouă, cum cuprinzi
în suflet o minune.
Ne arde-apropierea, ochi în ochi cum stăm.
Şi totuşi tu-mi şopteşti: "Mi-aşa de dor de tine!"
Aşa de tainic tu mi-o spui şi dornic, parc-aş fi
pribeag pe-un alt pământ.

Femeie,ce mare porţi în inimă şi cine eşti?
Mai cântă-mi înc-o dată dorul tău,
să te ascult
şi clipele să-mi pară nişte muguri plini,
din care înfloresc aievea — veşnicii.


SAUDADE
Sedento bebo teu perfume e seguro teu rosto
Com ambas as mãos, como quem segura na alma um milagre.
Queima-nos a proximidade, olhos nos olhos, como estamos.
E contudo sussurras-me: "Tenho tanta saudade de ti!"
Falas tão misteriosa e desejosa, como se eu estivesse exilado em
outro mundo.

Mulher,
que mares levas no peito, e quem és?
Canta ainda uma vez mais tua saudade, por que te ouça
e os instantes me pareçam botões prenhes de que florescessem de facto... eternidades.

De Poemele Luminii (Os Poemas da Luz), 1919

http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet156.htm

Brasil

Búzios

Vinicius de Moraes

Procura-se um amigo

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.
Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.
Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.

http://www.secrel.com.br/jpoesia/vm4.html#procura

Timor


Jorge Lauten

Não Mais Sob a Árvore de Bô

Não mais a pureza de Ramahyana
o incenso e o sândalo
os pés nus nas pedras do templo

enquanto eles comerem na minha mesa
na velha casa de Dili

não mais me sentarei sob a árvore de Bô


http://www.jornaldepoesia.jor.br/jo02.html

15 maio 2006

Portugal

Meco - Praia das Bicas

Eugénio de Andrade (19/01/1923-13/06/2005)

Mar de Setembro

Tudo era claro:
céu, lábios, areias.
O mar estava perto,
Fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves, só
alma e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto,
puríssimo, doirado.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/eda.html


13 maio 2006

Brasil


Carlos Drummond de Andrade
Itabira (31/10/1902-17/08/1987)

Hino nacional

Precisamos descobrir
o Brasil!
Escondido atrás
as florestas,
com a água dos rios no
meio,
o Brasil está dormindo,
coitado.
Precisamos colonizar
o Brasil.
O que faremos
importando francesas
muito louras, de pele
macia,
alemãs gordas, russas
nostálgicas para
garçonetes dos
restaurantes noturnos.
E virão sírias fidelíssimas.
Não convém desprezar as japonesas...
Precisamos educar
o Brasil.
Compraremos professores
e livros,
assimilaremos finas
culturas,
abriremos dancings e
subvencionaremos as
elites.
Cada brasileiro terá sua
casa
com fogão e aquecedor
elétricos, piscina,
salão para conferências
científicas.
E cuidaremos do Estado
Técnico.
Precisamos louvar o
Brasil.
Não é só um país sem
igual.
Nossas revoluções são
bem maiores
do que quaisquer outras;
nossos erros também.
E nossas virtudes? A
terra das sublimes paixões...
os Amazonas
inenarráveis... os
incríveis João-Pessoas...
Precisamos adorar o
Brasil!
Se bem que seja difícil
compreender o que
querem esses homens,
por que motivo eles se
ajuntaram e qual a razão
de seus sofrimentos.
Precisamos, precisamos
esquecer o Brasil!
Tão majestoso, tão sem
limites, tão
despropositado,
ele quer repousar de
nossos terríveis carinhos.
O Brasil não nos quer!
Está farto de nós!
Nosso Brasil é no outro
mundo. Este não é o
Brasil.
Nenhum Brasil existe. E
acaso existirão os brasileiros?
Eduardo Alves da Costa

Quanto a mim, sonharei
com Portugal
Às vezes, quando
estou triste e há silêncio
nos corredores e nas
veias,
vem-me um desejo de
voltar
a Portugal. Nunca lá
estive,
é certo, como também
é certo meu coração, em
dias tais,
ser um deserto.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/drumm1.html#hino

Bati no portão do tempo perdido, ninguém atendeu.

Bati segunda vez e mais outra e mais outra.

Resposta nenhuma.

A casa do tempo perdido está coberta de hera

pela metade; a outra metade são cinzas.

Casa onde não mora ninguém, e eu batendo e chamando

pela dor de chamar e não ser escutado.

Simplesmente bater. O eco devolve

minha ânsia de entreabrir esses paços gelados.

A noite e o dia se confundem no esperar,

no bater e bater.

O tempo perdido certamente não existe.

É o casarão vazio e condenado.

Carlos Drummond de Andrade

de:INÊS 7.º2." 2/6/2006
02 Junho, 2006 13:53

Moçambique

Gaza

Mia Couto
Beira (1955)

Companheiros

quero
escrever-me de homens
quero
calçar-me de terra
quero ser
a estrada marinha
que prossegue depois do último caminho
e quando ficar sem mim
não tereri escrito
senão por vós
irmãos de um sonho
por vós
que não sereis derrotados
deixo
a paciência dos rios
a idade dos livros
mas não lego
mapa nem bússola
por que andei sempre
sobre meus pés
e doeu-me
às vezes
viver
hei-de inventar
um verso que vos faça justiça
por ora
basta-me o arco-íris
em que vos sonho
basta-te saber que morreis demasiado
por viverdes de menos
mas que permaneceis sem preço
companheiros

Angola

Luanda

Agostinho Neto
(Catete-17/09/1922- 1979-Moscovo)

O Choro de África
O choro durante séculos
nos seus olhos traidores pela servidão dos homens
no desejo alimentado entre ambições de lufadas românticas
nos batuques choro de África
nos sorrisos choro de África
nos sarcasmos no trabalho choro de África
Sempre o choro mesmo na vossa alegria imortal
meu irmão Nguxi e amigo Mussunda
no círculo das violências
mesmo na magia poderosa da terra
e da vida jorrante das fontes e de toda a parte e de todas as almas
e das hemorragias dos ritmos das feridas de África
e mesmo na morte do sangue ao contato com o chão
mesmo no florir aromatizado da floresta
mesmo na folha
no fruto
na agilidade da zebra
na secura do deserto
na harmonia das correntes ou no sossego dos lagos
mesmo na beleza do trabalho construtivo dos homens
o choro de séculos
inventado na servidão
e espíritos infantis de África
as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas
o choro de séculos
onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro
da desonesta forca
sacrificadora dos corpos cadaverizados
inimiga da vida
fechada em estreitos cérebros de maquinas de contar
na violência
na violência
na violência
O choro de África é um sintoma
Nos temos em nossas mãos outras vidas e alegrias
desmentidas nos lamentos falsos de suas bocas - por nós!
E amor
e os olhos secos.

(Poemas, 1961)

12 maio 2006

Manuela de Abreu, Bela Vista, Huambo, Angola (n.20/06/1939)

Huambo

Manuela de Abreu
Bela Vista, Huambo, 20/06/1939

Pastorela

Sou pastora: guardo poemas
rebanho que a ti me leva
por carreiros doutra vez
que fecundo em cada treva.

Sou pastora: guardo abril
pelas montanhas de lã
e a fartura para abrir
quando o leite diz manhã.

Sou pastora: guardo amor
guardo Angola, aqui por onde
o meu rebanho é de sol
que fecundo em cada fronde.

in "Artes e Letras" d' A Província de Angola, 10/12/1974